Poá, 08 de junho de 1975
Prezado amigo Nicodemos,
O motivo destas mal traçadas linhas é para comunicar-lhe que sua mãe, Dona Epifânia, sucedeu óbito na noite de ontem.
Sei que será um choque esta notícia, mas choque maior recebeu a falecida, precisamente 2.000 volts.
Você sabe que na vida rotineira em que ela levava havia momentos em que parecia procurar pela morte. Muitas vezes a encontrei bêbada, caída na calçada ao lado de dois cães moribundos.
Todo mundo me perguntava por que ela bebia...
Nicodemos, a nossa amizade me permite dizer a verdade, sua mãe era uma cachaceira de mão cheia! Acordava com uma garrafa debaixo do braço e não largava mais durante o resto do dia!
No momento de sua morte a pobrezinha estava tomando um banho bem demorado, como era de costume. Ah compadre! E o cheiro que emanava do banheiro não era diferente de uma fossa aberta, isso por que a cachaça impregnada no corpo dela saía com a água quente, e após 45 minutos embaixo do chuveiro, ela resolveu aumentar a temperatura, pois aquela pele cozida pela marvada já não apresentava mais muita sensibilidade.
Meu amigo, juro que não tive culpa, eu não deixei os fios descascados propositadamente. Nunca esperei que isso viesse acontecer um dia, mas você deve entender que onde ela estiver deverá estar melhor que aqui.
Um abraço e os pêsames de seu amigo e compadre,
João Batista da Gama.